O Rio Grande do Sul está entre os estados campeões de cesarianas, com 64% dos partos realizados por esta via. O índice nacional é de 50%, e a preconização da Organização Mundial de Saúde (OMS) é que as cesáreas fiquem entre 10% e 15% de todos os nascimentos. Os números foram apresentados no seminário de Humanização do Parto e do Nascimento no Rio Grande do Sul, promovido pela Procuradoria Especial da Mulher e Associação de Doulas do Rio Grande do Sul, na tarde desta segunda-feira (20).
Com a participação de mais de 500 pessoas por meio virtual, oriundas de 60 municípios gaúchos e 25 de outros estados brasileiros, o evento abordou, em três painéis, questões como a violência obstétrica, retrocessos na legislação que assegura o atendimento materno-infantil no Brasil e a Lei da Doula.
A coordenadora da Procuradoria da Mulher, deputada Sofia Cavedon (PT), declarou que o propósito do encontro é valorizar as ações afirmativas de proteção às gestantes e aos bebês e somar forças para “resistir aos ataques ao direito das mulheres de terem um atendimento humanizado e digno”. Em sua opinião, a população vem sendo enganada pela disseminação de conceitos em relação ao parto, que significam apenas reserva de mercado.
O elevado número de cesarianas foi apontado como uma forma de violência obstétrica, junto com outras práticas, como os xingamentos das parturientes, manobra de Kristeller (pressionar a barriga da parturiente durante o parto) ou a não utilização de analgésicos quando tecnicamente indicados. A vice- presidente do Conselho Estadual da Saúde, a enfermeira Inara Ruas, uma das palestrantes do primeiro painel da tarde, afirmou que em alguns municípios do interior o índice é de 100%. A situação é tão preocupante que o próprio governo do estado e a Sociedade de Obstetrícia, segundo ela, vêm dialogando para estimular o parto normal.
Inara criticou também a Rede de Atenção Materna e Infantil (Rami), instituída pelo governo federal por meio de uma portaria, para substituir a Rede Cegonha. A nova política, em sua opinião, acumula absurdos, como recomendar o aleitamento materno como método anticoncepcional e suprimir direitos das gestantes, mantendo apenas o de pedir a realização de uma cesárea.
A enfermeira Jerusa Bitercourt, que atua no Pronto-atendimento da Vila Cruzeiro do Sul em Porto Alegre, considera que o momento é de negação de direitos e de remodelagem de políticas públicas. “Inclusive, para negar a existência da violência obstétrica e, assim, impedir que lutemos pela humanização do atendimento. Neste contexto, é fundamental a reafirmação das lutas históricas das mulheres, a começar pela saúde como um direito de toda a população”, apontou.
Já a antropóloga e coordenadora da Themis – Gênero, Justiça e Direitos Humanos, Renata Jardim , apresentou dados da Pesquisa Nascer no Brasil. De acordo com o levantamento, 45% das mulheres atendidas pelo SUS e 30% das atendidas em rede privada já foram vítimas de violência obstétrica. As mulheres pobres, pretas, pardas, periféricas e LGBTs são os principais alvos de práticas violentas, segundo a pesquisa.
Por fim, a médica Ingrid Matos lembrou que os direitos do bebê iniciam com o direito da mãe a um atendimento humanizado e de qualidade. Para ela, a violência muitas vezes começa na dificuldade ao acesso à assistência médica e social. “Mais do que um espaço adequado, é preciso políticas públicas de assistência efetivas, pois a pobreza é fator de risco em qualquer patologia”, ressaltou.
A médica elencou medidas que têm baixo custo, mas que podem melhorar em muito a condição dos recém-nascidos e das mães, como o contato pele a pele logo após o parto por uma hora e a prescrição de medicamentos adequados para depressão pós-parto para evitar a suspensão da amamentação
O seminário teve a realização dos painéis “Humanização na prática: recursos para uma melhor experiência de parto” e “Lei da Doula como instrumento para a promoção dos direitos das mulheres e pessoas gestantes”, que podem ser assistidos no link: https://bit.ly/3ya2bbO
Fonte: Agência de Notícias da ALRS